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terça-feira, 2 de novembro de 2010

novembro

o que virá depois? - pergunto então para as luzes da janela atrás dos vidros, e me sinto reconfortado como se houvesse qualquer coisa feito um futuro à minha espera. e espero. espero. são coisas assim em que me pego pensando nessas tardes frias de dias de semana. sentado aqui no degrau gelado eu fumo um cigarro tentando pensar em nada-nada mesmo, tipo um lobo-uivando-para-uma-lua-nem-aí. e rio. e choro.
falava da escada, então vou começar por ela. ela é toda de mármore laminado, frio como a noite, num tom cinza-escuro misturado com preto e branco que forma um arabesque que se retorce degrau acima e degrau abaixo. daí tomo coragem e levanto a cabeça e olho pra rua e consigo ver as pessoas e as luzes da cidade e os carros passando numa velocidade vertiginosa que me faz querer vomitar. são meio cinzas quase transparentes, as pessoas, e os barulhos que elas fazem são estridentes remoendo e guinchando e murmurando nada que me apetece ouvir. conheço bem essas pessoas, e seus gritinhos. mas não quero me apressar. penso que se conseguir dar uma sequencia, terei que dar ordem e depois algum sentido. e penso junto. ou depois, não sei.
assim como se depois do chá fumasse lentamente um cigarro light, olhando para longe, aquecido pelo café e tranquilizado pelo cigarro, enlevado pelo longe e principalmente atento ao que virá depois deste momento. faz tempo que não tomo café, e controlo tanto os cigarros que, cada vez que acendo um, a sensação é de culpa, não de prazer, você me entende?
ah me desculpe. quando eu pergunto 'você me entende' não estou te chamando de burra mas preciso ter a certeza de que você esta olhando pra mim atenta e sorrindo ou não sem apagar esse cigarro que te traz pra mim toda hora. e pergunto pro azul-escuro da madrugada se toda vez que você vem, vem com um porquê. porquê. porquê. passo mal olhando pro horizonte e tento inutilmente desviar o olhar. inutilmente porque meu rosto fica próximo da janela e toda vez que me foco em outro lugar, me apoio nessa parede gelada-feito-madrugada e sento olhando pra esse tapete marrom-e-bege que me dá vertigem também.
dentro de mim, não consigo deixar de pensar que deve haver um sentido, um depois e quando penso nisso e como se alguma coisa se movesse dentro mim e fosse pra esse horizonte infinito nos telhados cinzentos, vestido de branco. nao sei porque exatamente branco, mas brilha. o vento faria esvoaçar o se cabelo cabelo e os panos, e num salto esse alguem dançaria e me puxaria daqui só de sorrir, abrindo essa janela que me prende
não, não diga nada, prefiro não saber que não. nem que sim. você me despreza por estar aqui assim parado? e outra vez, não diga nada. sei que nesse salto você me tiraria desse degrau só com o toque da ponta dos dedos e me levaria pra depois dessa escada, além dessa rua pra andarmos na calçada cheia de luzes. sei também que se você chegasse afastaria uma a uma essas pessoas cinzas e que gritam e me levaria pro conforto da cama do seu quarto, aquela que tem dois travesseiros e uma almofada cheia de bolinhas e a ficaríamos só nós dois sozinhos, deitados nas noites frias de julho, sem ninguém e nada.
queria pensar que é esse o sentido e é esse o depois. o 'volta pra mim', mas não sei se posso. há dias, como hoje, por exemplo, que mal consigo enxergar os panos dançando no horizonte. o dia está muito frio. quando a noite avançar, sei que me encontrará sentado no degrau. e depois que o cinza tiver se transformado em azu depois rosa e violeta e em azul profundo de novo, ainda estarei parado no centro daquela escad, ouvindo gritos e berros e guinchos estridentes e o riso das pessoas. chorarei então. muito alto, com todas as minhas forças, durante muito tempo. não sei se vai ser assim, ou se é assim. mas continuo aqui, sentado, esperando e fumando.

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